Em artigo, ex-presidente condena a
concessão de 100 mil bolsas ao exterior a estudantes brasileiros, num
programa que é um dos xodós da presidente Dilma: "uma profusão de
bolsas, um menoscabo da capacidade universitária já instalada e o envio
ao exterior de muitos que nem sequer conhecem bem a língua do país onde
vão estudar"; programa é usado como exemplo da profusão de "projetos
grandiosos" e "discursos grandiloquentes"
247 -
Em seu artigo mensal nos jornais Globo e Estado, o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso condena "projetos grandiosos" e "discursos
grandiloquentes" dos governos petistas e usa como exemplo o "Ciência sem
Fronteiras", um dos xodós da presidente Dilma Rousseff, que pretende
enviar 100 mil estudantes ao exterior em quatro anos. Leia abaixo:
Apesar de parecer difícil
guardar otimismo e manter esperanças diante do quadro atual de crise
financeira e desatinos políticos, sempre se há de tentar construir um
futuro melhor.
Descartes dizia que o bom
senso é a coisa mais bem distribuída entre as pessoas. Em sua época,
bom senso equivalia à razão. Na linguagem atual corresponderia a dizer
que o coeficiente de inteligência (QI) se distribui entre todas as
pessoas seguindo uma curva que se mantém inalterada no tempo, geração
após geração. Será? E possível e mesmo provável. Mas bom senso implica
também inteligência emocional e prudência ao tomar decisões. Não basta
ser inteligente, é preciso ser razoável e prudente para evitar que as
paixões se sobreponham à razão. É preciso ter juízo.
Ora, no mundo em que
vivemos, pelo menos neste momento, parece grande o risco de ações
impulsivas comprometerem o que é razoável. Quando ainda se podia crer
que havia uma "lógica econômica" para justificar ações de força - por
exemplo, na época do colonial-imperialismo a repulsa ao inaceitável (a
subordinação de povos à acumulação de riquezas)
vinha seguida da explicação "lógica" do porquê das ações: o objetivo
seria acumular riquezas e expandir o capitalismo. Mas, e agora, quando a
Coréia do Norte bravateia (e quem sabe o que fará) que pode arrasar o
Sul e mesmo atingir a costa oeste dos Estados Unidos, qual é a lógica? E
que dizer do dr. Bashar Assad, que fechou sua clínica médica em Londres
para substituir o pai no poder e bombardeia seus conterrâneos há dois
anos?
Fossem só esses os
exemplos... Mas, não. Na pequena Chipre, cujo sistema bancário se tornou
abrigo para capitais de procedência discutível, quando não claramente
resultantes da corrupção e da evasão fiscal, vê-se um governo que, sem
mais essa nem aquela, temeroso da pressão dos controladores financeiros
da União Européia (UE), não tem ideia melhor do que expropriar os
depositantes - sejam ou não proprietários de capitais de origem
discutível. Embora menos flagrantemente absurdo, o mau manejo financeiro
e fiscal na UE não está levando os povos ao desespero, tanta a
injustiça de fazer com que quem não tem culpa pague pelo desatino de
governos e financistas?
Ainda bem que nem tudo é
desatino. Barack Obama, ao tomar posse de seu primeiro mandato, disse
que os EUA deveriam investir mais em ciência e tecnologia e preparar uma
revolução produtiva baseada na energia limpa, juntando conhecimento e
inovação com a possibilidade de a economia crescer sem destruir o meio
ambiente. Na semana passada renovou a crença e parece que seu país está
saindo da crise iniciada em 2008 fazendo o que era necessário: abrindo
novas áreas de investimento, alterando a geopolítica da energia e, quem
sabe, deixando para trás os tremendos erros que levaram à explosão dos
mercados financeiros.com. Será? Torçamos para que desta vez prevaleça
não só a razão cartesiana, mas o bom sentido comum e se entenda que
mercados sem regulação levam à irracionalidade.
Quanto a nós,
brasileiros, parece que tampouco aprendemos muito com equívocos
voluntaristas do passado. Somos reincidentes. Juntamos aos impulsos
movidos por boa vontade certa grandiosidade que não corresponde à
realidade. Ao desejar sair da ameaça de baixo crescimento econômico a
todo custo, vão sendo anunciados a cada dia novos planos e programas.
Entretanto, só saem do papel morosamente e muitas vezes, nem isso. Por
quê?
Talvez porque acreditemos
demais em grandes planos salvadores e menos no método, na rotina, na
persistência e na inovação para acelerar o caminho. O governo, por
exemplo, percebeu que o futuro depende do conhecimento e que existe um
quase apagão de gente qualificada para o País encarar o futuro com maior
otimismo. Logo, havia que propor a "grande solução": em vez de termos
minguados 8.500 bolsistas no exterior, passaríamos logo a 100 mil em
quatro anos! Resultado: uma profusão de bolsas, um menoscabo da
capacidade universitária já instalada e o envio ao exterior de muitos
que nem sequer conhecem bem a língua do país onde vão estudar.
Do mesmo modo, ao se
descobrir que havia óleo na camada do pré-sal largamos o etanol,
esquecemos que os poços se extinguem, não investimos suficientemente nas
áreas fora do pré-sal e desdenhamos o que de novo pode ter havido no
mundo, como as inovações na extração do óleo e do gás do xisto, como
fizeram os americanos. Claro que ainda há tempo para recuperar o tempo
perdido e retomar a esperança. Mas se, em vez de cantar loas ao que
ainda não é palpável e dedicar tanto tempo à briga pelos futuros
royalties do petróleo, tivéssemos, sem muito bumbo, discutido
metodicamente as melhores alternativas energéticas, inclusive as do
petróleo, e tivéssemos apoiado mais a pesquisa e a inovação,
provavelmente sentiríamos menos angústia por oportunidades perdidas.
O comentário vale para
toda a infraestrutura econômica. Ah, se tivéssemos preparado leilões bem
feitos para as concorrências nas estradas, nos portos, nos aeroportos, e
assim por diante, poderíamos ter evitado o desperdício de parte "da
maior safra de grãos da história" pelas péssimas condições de transporte
e embarque dos produtos.
Para remediar propõem-se
sempre mais projetos grandiosos e tanto o governo como seus arautos se
perdem em discursos grandiloquentes Não é isso o que ocorre também com
as medidas para enfrentar as ameaças de uma ainda mais alta inflação?
Imediatismo e atropelo na concessão de subsídios, isenções e favores
substituem a pachorrenta persistência numa linha de conduta coerente
que, menos espalhafatosamente, possa levar o País a dias melhores.
Estes, entretanto, são
possíveis. O xis da questão é simples de ser formulado, difícil de ser
executado: como passar da quantidade para a qualidade, do palavrório
para uma gestão prática; como, em vez de animar uma sociedade de
espetáculos (nunca na História...), construir uma sociedade decente, na
qual a palavra corresponda a fatos, e não a piruetas virtuais. Continuo a
crer que é possível. Mas é preciso mudar de guarda. Esperemos 2014.
Via Facebook
Em artigo, ex-presidente condena a
concessão de 100 mil bolsas ao exterior a estudantes brasileiros, num
programa que é um dos xodós da presidente Dilma: "uma profusão de
bolsas, um menoscabo da capacidade universitária já instalada e o envio
ao exterior de muitos que nem sequer conhecem bem a língua do país onde
vão estudar"; programa é usado como exemplo da profusão de "projetos
grandiosos" e "discursos grandiloquentes"
247 -
Em seu artigo mensal nos jornais Globo e Estado, o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso condena "projetos grandiosos" e "discursos
grandiloquentes" dos governos petistas e usa como exemplo o "Ciência sem
Fronteiras", um dos xodós da presidente Dilma Rousseff, que pretende
enviar 100 mil estudantes ao exterior em quatro anos. Leia abaixo:
Apesar de parecer difícil
guardar otimismo e manter esperanças diante do quadro atual de crise
financeira e desatinos políticos, sempre se há de tentar construir um
futuro melhor.
Descartes dizia que o bom
senso é a coisa mais bem distribuída entre as pessoas. Em sua época,
bom senso equivalia à razão. Na linguagem atual corresponderia a dizer
que o coeficiente de inteligência (QI) se distribui entre todas as
pessoas seguindo uma curva que se mantém inalterada no tempo, geração
após geração. Será? E possível e mesmo provável. Mas bom senso implica
também inteligência emocional e prudência ao tomar decisões. Não basta
ser inteligente, é preciso ser razoável e prudente para evitar que as
paixões se sobreponham à razão. É preciso ter juízo.
Ora, no mundo em que
vivemos, pelo menos neste momento, parece grande o risco de ações
impulsivas comprometerem o que é razoável. Quando ainda se podia crer
que havia uma "lógica econômica" para justificar ações de força - por
exemplo, na época do colonial-imperialismo a repulsa ao inaceitável (a
subordinação de povos à acumulação de riquezas)
vinha seguida da explicação "lógica" do porquê das ações: o objetivo
seria acumular riquezas e expandir o capitalismo. Mas, e agora, quando a
Coréia do Norte bravateia (e quem sabe o que fará) que pode arrasar o
Sul e mesmo atingir a costa oeste dos Estados Unidos, qual é a lógica? E
que dizer do dr. Bashar Assad, que fechou sua clínica médica em Londres
para substituir o pai no poder e bombardeia seus conterrâneos há dois
anos?
Fossem só esses os
exemplos... Mas, não. Na pequena Chipre, cujo sistema bancário se tornou
abrigo para capitais de procedência discutível, quando não claramente
resultantes da corrupção e da evasão fiscal, vê-se um governo que, sem
mais essa nem aquela, temeroso da pressão dos controladores financeiros
da União Européia (UE), não tem ideia melhor do que expropriar os
depositantes - sejam ou não proprietários de capitais de origem
discutível. Embora menos flagrantemente absurdo, o mau manejo financeiro
e fiscal na UE não está levando os povos ao desespero, tanta a
injustiça de fazer com que quem não tem culpa pague pelo desatino de
governos e financistas?
Ainda bem que nem tudo é
desatino. Barack Obama, ao tomar posse de seu primeiro mandato, disse
que os EUA deveriam investir mais em ciência e tecnologia e preparar uma
revolução produtiva baseada na energia limpa, juntando conhecimento e
inovação com a possibilidade de a economia crescer sem destruir o meio
ambiente. Na semana passada renovou a crença e parece que seu país está
saindo da crise iniciada em 2008 fazendo o que era necessário: abrindo
novas áreas de investimento, alterando a geopolítica da energia e, quem
sabe, deixando para trás os tremendos erros que levaram à explosão dos
mercados financeiros.com. Será? Torçamos para que desta vez prevaleça
não só a razão cartesiana, mas o bom sentido comum e se entenda que
mercados sem regulação levam à irracionalidade.
Quanto a nós,
brasileiros, parece que tampouco aprendemos muito com equívocos
voluntaristas do passado. Somos reincidentes. Juntamos aos impulsos
movidos por boa vontade certa grandiosidade que não corresponde à
realidade. Ao desejar sair da ameaça de baixo crescimento econômico a
todo custo, vão sendo anunciados a cada dia novos planos e programas.
Entretanto, só saem do papel morosamente e muitas vezes, nem isso. Por
quê?
Talvez porque acreditemos
demais em grandes planos salvadores e menos no método, na rotina, na
persistência e na inovação para acelerar o caminho. O governo, por
exemplo, percebeu que o futuro depende do conhecimento e que existe um
quase apagão de gente qualificada para o País encarar o futuro com maior
otimismo. Logo, havia que propor a "grande solução": em vez de termos
minguados 8.500 bolsistas no exterior, passaríamos logo a 100 mil em
quatro anos! Resultado: uma profusão de bolsas, um menoscabo da
capacidade universitária já instalada e o envio ao exterior de muitos
que nem sequer conhecem bem a língua do país onde vão estudar.
Do mesmo modo, ao se
descobrir que havia óleo na camada do pré-sal largamos o etanol,
esquecemos que os poços se extinguem, não investimos suficientemente nas
áreas fora do pré-sal e desdenhamos o que de novo pode ter havido no
mundo, como as inovações na extração do óleo e do gás do xisto, como
fizeram os americanos. Claro que ainda há tempo para recuperar o tempo
perdido e retomar a esperança. Mas se, em vez de cantar loas ao que
ainda não é palpável e dedicar tanto tempo à briga pelos futuros
royalties do petróleo, tivéssemos, sem muito bumbo, discutido
metodicamente as melhores alternativas energéticas, inclusive as do
petróleo, e tivéssemos apoiado mais a pesquisa e a inovação,
provavelmente sentiríamos menos angústia por oportunidades perdidas.
O comentário vale para
toda a infraestrutura econômica. Ah, se tivéssemos preparado leilões bem
feitos para as concorrências nas estradas, nos portos, nos aeroportos, e
assim por diante, poderíamos ter evitado o desperdício de parte "da
maior safra de grãos da história" pelas péssimas condições de transporte
e embarque dos produtos.
Para remediar propõem-se
sempre mais projetos grandiosos e tanto o governo como seus arautos se
perdem em discursos grandiloquentes Não é isso o que ocorre também com
as medidas para enfrentar as ameaças de uma ainda mais alta inflação?
Imediatismo e atropelo na concessão de subsídios, isenções e favores
substituem a pachorrenta persistência numa linha de conduta coerente
que, menos espalhafatosamente, possa levar o País a dias melhores.
Estes, entretanto, são
possíveis. O xis da questão é simples de ser formulado, difícil de ser
executado: como passar da quantidade para a qualidade, do palavrório
para uma gestão prática; como, em vez de animar uma sociedade de
espetáculos (nunca na História...), construir uma sociedade decente, na
qual a palavra corresponda a fatos, e não a piruetas virtuais. Continuo a
crer que é possível. Mas é preciso mudar de guarda. Esperemos 2014.
Via Facebook
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Sinceramente, temos que nos controlar
para não mandar esse pulha tomar banho. O correto (para ele) era como no
seu governo, apenas os apadrinhados e previlegiados estudavam no
exterior. É inacreditável que alguém de bom senso (como ele cita)
consiga concordar com este noiado.
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